do G1
Homem que agia em Campinas, no interior de SP, foi preso em abril. Ele resolveu contar tudo o que sabia sobre corrupção policial.
A polícia desmontou uma quadrilha que agia no interior de São Paulo supostamente liderada por um homem de 30 anos, estudante de direito. Depois da prisão, ele resolveu contar tudo o que sabia sobre corrupção policial. As informações levaram à prisão de quatro policiais civis e quatro PMs.
Durante as investigações, os policiais cercaram uma chácara ampla e confortável. Na garagem, havia três carros de luxo. O dono é o homem de 30 anos, apontado como o chefe de uma das maiores quadrilhas do interior de São Paulo. No próximo mês, ele iria se formar em direito em uma faculdade particular de Campinas, a 93 km de São Paulo.
Conhecedor das leis, o homem montou uma rede de proteção, subornando policiais. Em outubro do ano passado, o estudante chegou a gravar uma entrega da propina, no estacionamento de um shopping. No vídeo, um integrante da quadrilha mostra o dinheiro. São R$ 3 mil. O criminoso põe o pacote no porta-malas e vai para a praça de alimentação do shopping.
O encontro dele com dois policiais militares é fotografado por um criminoso. Na volta, acontece o pagamento da propina. O criminoso é procurado pela Justiça por roubo e tráfico. Um dos dois policiais é soldado e o outro, cabo. Segundo as investigações, os PMs cobraram R$ 30 mil para não prender um comparsa do estudante.
Os R$ 3 mil são apenas a primeira parcela. “O traficante e seus comparsas apresentavam essas gravações para os policiais e a extorsão parou naquele momento”, conta o promotor de Justiça Amauri Silveira. O comparsa foi preso quatro meses depois, em uma operação policial de rotina. Nessa época, o estudante já estava sendo investigado pela Delegacia de Combate ao Tráfico de Drogas.
O que ele aprendia nas aulas de direito, aplicava no crime. Pedia, por exemplo, que jovens vendessem a droga, já que menor de idade não é preso e fica pouco tempo em centros de recuperação. O estudante foi preso em abril. A polícia achou a gravação do suborno dos dois PMs no computador dele. Também foram encontradas planilhas, com toda a contabilidade da quadrilha. Ele desenvolveu gráficos para controlar o desempenho de cada ponto de venda e saber exatamente quanto lucrava com o tráfico.
Em uma favela, a polícia descobriu o laboratório onde o bando refinava cocaína. No local, havia 80 quilos da droga e mais de dois milhões de frascos usados para embalar a cocaína vendida nas ruas. “A grande base dele de distribuição de drogas era em Campinas, com mais de 75 pontos de distribuição. Também se constatou que ele já tinha pontos de distribuição em São Paulo e na cidade de Mogi das Cruzes”, afirma José Rolim Neto, delegado seccional de Campinas.
Preso, o chefe da quadrilha resolveu contar tudo o que sabe sobre a corrupção policial, em troca da redução da pena – a chamada delação premiada. Segundo as investigações, o estudante de direito vendeu, durante um ano e meio, quase R$ 8 milhões em drogas, o que despertou o interesse de policiais corruptos da cidade de Campinas. Em troca de pagamento de propina mensal, o traficante era avisado das investigações em andamento. Policiais civis e militares também faziam a segurança dos pontos de venda de drogas e ainda mandavam para a cadeia os concorrentes da quadrilha.
Na quarta-feira (16), o Fantástico acompanhou a operação contra os policiais corruptos. A Corregedoria prendeu quatro policiais civis e quatro PMs quando chegavam ao trabalho, inclusive os que aparecem na imagem recebendo propina. Durante as buscas, outro crime: um policial estocava maconha dentro do batalhão. “Os policiais civis e militares estão sujeitos à pena, no caso de associação para o tráfico, de até dez anos de reclusão”, explica o delegado corregedor Roveraldo Battaglini.
Quando estudava direito, o chefe da quadrilha preparava o trabalho de conclusão de curso. O título: “A delação premiada sob a ótica da ética e da moral”. No texto, encontrado no computador dele, aparece a seguinte frase: “não há nada de imoral e não se trata de deduragem, sendo uma forma eficaz de combater a criminalidade organizada”.
“Ele já vinha realmente preparando um ensejo de eventual delação premiada”, aponta o promotor de Justiça Amauri Silveira. O estudante pode ser condenado a 25 anos de cadeia. No fim do processo, a Justiça decide se ele tem direito, ou não, à redução da pena. A Corregedoria e o Ministério Público acreditam que outros policiais tenham participado do esquema de corrupção criado pelo estudante. “A investigação tem por objetivo justamente definir a exata medida da responsabilidade de cada um dos envolvidos”, declara o promotor de Justiça Amauri Silveira.